Auto-Organização: a competência de um campo vital inteligente
Os paradigmas – essas premissas e estruturas de pensamento coletivas, que determinam o pensamento de um tempo -, que não vemos e que não estão acessíveis à nossa consciência (a não ser através de um processo crítico e autocrítico orientado), configuram modos de pensar de um tempo, e condicionam jeitos de entender, ver e perceber e de encontrar soluções para os problemas que emergem. Ainda que paradigmas mudem, eles têm sempre um efeito de conservação ao longo dos anos.
No que tange aos sistemas de cuidado com a vida, com a doença e com a saúde, isso não é diferente. Ao longo do processo de construção e sistematização dos saberes médicos, tendências estiveram em pleno embate, disputando a hegemonia do campo da saúde e da doença. A busca pela etiologia das doenças e dos processos de adoecimento sempre foi uma constante. As doenças vêm de fora, em forma de agentes oportunistas que invadem os organismos e determinam suas estruturas ou as doenças são um resultado de um campo vital em desequilíbrio? Nossa cultura, eminentemente ocidental, opera por dicotomias, por polaridades, por oposições. Isso ou aquilo? O aspecto complexo dos processos, que se traduziria em um “isso e aquilo” é, de alguma forma, recente na história do pensamento.
No entanto, voltando à questão central deste texto, podemos entender que uma tendência que atravessa a história filosófica do pensamento sobre saúde e doença, apoia-se sobre esta dicotomia, que pode ser traduzida pelas perguntas: as doenças vêm de fora ou as doenças vêm de dentro? Certo é que a forma como nos identificamos com estas perguntas irá determinar, também, a forma como entenderemos os processos de saúde: a saúde é uma dimensão que vem de fora ou que se estrutura dentro dos seres vivos?
Independente do que pensemos – ontem ou hoje -, o paradigma que predominou, ao longo do tempo, tem sido o de que as doenças são causadas por algo que vem de fora, seja contato com vírus, bactérias, parasitas, contágios; ou seja por uma série de aspectos exteriores. E, logo, como acima dissemos, predomina também, ao nível individual e coletivo, a crença de que saúde é um processo que advém de intervenções externas: de um medicamento, de um antibiótico, do saber de um especialista, de uma intervenção médica, de um saber que não nos pertence, de um exame feito por um aparelho sofisticado. Isso, em uma sociedade capitalista, que se estrutura sobre o capital e o lucro; e isso também, em uma sociedade do desempenho, que acelera os tempos, dessacraliza a potencialidade da vida. Já poderíamos dizer aqui, que o processo que predomina nos conduz a uma alienação tão grande, a respeito de nós mesmos, que isso já seria um estado patológico existencial.
Como estamos na era do “e” e não do “ou”, reconhecemos a importância de todo o sistema médico no processo de reequilíbrio dos campos vitais. Mas o que talvez nunca pensemos, é que tal premissa esvazia o campo da vida, ou o Biocampo, de sua capacidade inata de auto-organização e de regeneração, e a vida, de sua inteligência interior. Esvazia, enfraquece e dessacraliza o potencial inato da vida.
Aqui queremos, de forma breve e não cientificista, afirmar a competência auto-organizadora e inteligente da vida. Se você se interessa pelo tema e quer aprofundar, recomendo o livro da médica Míria de Amorim “BioFAO: Uma Medicina para um Novo Tempo”, de 2018. De uma forma breve, o trabalho de Míria de Amorim com a BioFAO, que hoje é de uma comunidade médica, assenta-se sobre a premissa de que o Biocampo ou campo vital, de cada organismo vivo, é dotado da competência auto-organizadora, porque é um campo inteligente. Ele tem saber próprio, tem sentido próprio, tem potência própria. O campo possui sua dinâmica própria e ele também possui memórias inatas de equilíbrio e saúde, para além de todos os desequilíbrios. Quando adoecemos – e hoje os adoecimentos são complexos, porque multifatoriais -, o campo vital se afasta de seu equilíbrio e suas capacidades inatas, e caminha em um sentido entrópico (para o caos e a desorganização). A médica Míria de Amorim trabalha com a metáfora de uma Via Láctea interior – como uma estrada de luz e propósito-, para explicar o campo inteligente e auto-organizador da vida. E trabalha com o abismal escuro, como as regiões que nos afastam deste caminho interno de luz.
A Medicina dos Fatores de Auto-Organização do Biocampo nasce com essa premissa. E como crê nas capacidades inatas, sobredeterminando os processos externos, utiliza uma terapêutica homeopática, que se traduz de forma biofísica e não bioquímica, cuja função é provocar um estímulo na capacidade inteligente e auto-organizadora da vida. Assim, o médico BioFAO é alguém que trabalha com bioressonância: regula o campo do paciente, e não intervém sobre ele de maneira violenta, porque é o campo vital do paciente que irá se auto-organizar e não o médico ou o medicamento que fará esse papel.
Daí que optar por um paradigma em saúde que aposta nos processos internos e na capacidade inata, porque inteligente, aponta para uma medicina de alta singularização, que não se apoia em protocolos genéricos, mas que está à escuta deste campo do paciente. Por onde se inicia o processo de auto-organização não é algo que o médico possa controlar ou determinar, independente de seu saber e poder, mas é algo que ele pode acompanhar. O médico acompanha os processos e busca reconduzir o campo vital deste paciente para sua estrada luminosa interior, onde tudo acontece e pode acontecer a favor de si mesmo. O paciente, ao contrário do médico, é o sujeito gestor de seu processo. Precisa reaprender a ler os seus processos a partir de dentro e fazer novas escolhas existenciais. Precisa entender que cura não é supressão de sintomas, mas é uma aproximação de seus propósitos de vida e do amor. Só o paciente, que não é passível de nada, mas gestor de seu processo, poderá, auscultando seus processos internos, retomar o timão de sua embarcação. Daí uma medicina que é arte de viver.
Se você quiser, em um exemplo pequeno, observar esta competência auto-organizadora e regeneradora da vida, acompanhe um pequeno ferimento seu, sem intervenção de algo externo, a ir cicatrizando, com uma tecnologia que nenhuma medicina é capaz de inventar. Ou plante um feijão, como fazíamos quando éramos criança, e observe diariamente o que acontece com ele. Que energia ascendente e vital é aquela? É o mistério sagrado da vida, que nos pede reverência, e para o qual devemos reconduzir nossos saberes.